segunda-feira, 16 de agosto de 2010

CHASQUE DA CULTURA

CHASQUE DA CULTURA

Cláudio Pinto de Sá




“HABEAS PINHO”



Recordar fatos, conhecidos por muitos, também é uma característica do Chasque da Cultura. Novas gerações surgem e nem todos tiveram acesso ao que agora registro. O evento e a resultante, abaixo transcrita, ocorreu em 1955, na cidade de Campina Grande, na Paraíba. A Polícia apreendeu um violão que estava sendo executado, na rua e ao luar, por grupo de seresteiros. O (então) jovem advogado Ronaldo Cunha Lima, participante da serenata e que mais tarde se tornaria prefeito e governador, apresentou ao Juiz a seguinte petição:



O instrumento do crime que se arrola // Neste processo de contravenção // Não é faca, revolver ou pistola. // É simplesmente, Doutor, um violão! *** Um violão, Doutor, que, na verdade, // Não matou nem feriu um cidadão. // Feriu, sim, a sensibilidade // De quem o ouviu vibrar na solidão. *** O violão é sempre uma ternura, // Instrumento de amor e de saudade. // Ao crime ele nunca se mistura. // Inexiste, entre os dois, afinidade. *** O violão é próprio dos cantores, // Dos menestréis de alma enternecida, // Que cantam as mágoas e que povoam a vida, // Sufocando, assim, suas próprias dores. *** O violão é música e é canção, // É sentimento de vida e alegria, // É pureza e néctar que extasia, // É adorno espiritual do coração. *** Seu viver, como o nosso, é transitório, // Porém, seu destino o perpetua: // Ele nasceu para cantar, em plena rua, // E não para ser arquivo de Cartório. *** Mande soltá-lo, pelo Amor da noite // Que se sente vazia em suas horas, // Para que volte a sentir o terno açoite // De suas cordas leves e sonoras. *** Libere o violão, Dr. Juiz, // Em nome da Justiça e do Direito! // É crime, porventura, o infeliz, // Cantar as mágoas que lhe enchem o peito? *** Será crime, e afinal, será pecado, // Será delito de tão vis horrores, // Perambular na rua um desgraçado, // Derramando na rua as suas dores? *** É o apelo que aqui lhe dirigimos, // Na certeza, já, do seu acolhimento. // É somente liberdade, o que pedimos // E, nestes termos, vem pedir deferimento!



Há duas versões quanto à sentença dada pelo Dr. Juiz. A que segue é a mais aceita:



“Para que, por esta vida, eu não carregue // Mais um remorso, no cansado coração, // Determino, pois, que seja logo entregue // Ao seu dono, o malfadado violão!”



claudio@aymore1952.com.br

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