segunda-feira, 26 de julho de 2010

PAPO DE CULTURA - Ione Jaeger

Ione Jaeger


M E M E N T O C A T Á R T I C O




Quero saber, quem fez calar, emudecer,

meus cantos puros e pueris?

Onde estará o anel que tu me deste,

o chicote queimado, o lenço-atrás?

Perdidos nos pulos do jogo

da amarelinha para ao céu chegar?

Quiçá !

Ou, quem sabe? A Fadinha Luz entregou

para outra criança mais feliz !

Quisera saber quando deixei

o velho-do-saco levar minhas fantasias

deixando meus brinquedos estragados,

horrivelmente disformes,

amargurados:

Pai Francisco na prisão,

as cinco-marias desgarradas

bloqueando o passa-passará

às saídas de sentimentos magoados

Há quem me olha e se aproxima,

parecendo o temido bicho-papão.

Tremo, desconfio, fujo, me isolo,

quando a cuca me chama, aos quatro ventos,

de amiga, de querida, e me elogia.

O lobo-mau me assusta.

A bruxa mal intencionada me quer,

viva, cozinhar na fogueira da maldade

vendo gordo o meu minguinho.

Aprisionada no jogo-da-velha

me fazem cabra-cega e perguntam:

O que vós quereis, mata-tira, tirarei?

Na Berlinda estou, minha consciência!

Por que deixaste eu invadir essa ciranda em que me meti?

Como vou lidar com os fantasmas

da criança que, ainda, me acompanham?

Explica para eles o que nos aconteceu,

eu te peço, consciência!

Ora! responderás:

O que posso, sinceramente, te dizer?

Não soubeste dissimular o orgulho, a alegria, o entusiasmo,

a real busca do teu ideal. Não soubeste

mascarar a beleza da vida, a vida que crês,

que ditas, apregoas, sublimas e massacras,

e fazes com amor - o teu fanal!





Ione Jaeger - Novo Hamburgo, 2003

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